domingo, 27 de novembro de 2011

Estavam eles, com seus jeitos diferentemente calmos de lidar com aquela nova consciência que tomava a todos. Os corpos escuros escorriam as gotas ligeiramente brilhantes que corriam por seus rostos já encharcados.

            E agora corriam, sem saber porque, mas corriam. Corriam para lugar tal que não sabiam ao certo, mas era uma felicidade muito grande correr !! Era apenas o vento contra os olhos, que iam fechando-se e tentando outra vez se abrir, como que para encontrar a luz do sol, que já ia então caindo calmamente, como com preguiça de deixar toda aquela luz se acabar. A imagem túrgida de gotas de chuva através da luz definia-se como um todo de chão, ao caírem, e empoçavam a areia salgada da praia.

            A areia já cansada de água resolvia apoçar-se, com calma, aderindo toda aquela água viril.  As ondas tentavam alcançar toda aquela água, quando então percebiam que era tudo longe de mais, e retrocediam  dando lugar a uma onda mais corajosa, que subia por cima da primeira. E nesse indo e vindo, caem corpos eufóricos, corpos ávidos por um pouco desta tentativa de ida e volta. As ondas mostram seu peso e força, e a força dos meninos que La estavam jogados míngua, naquela gostosa sensação de deixar estar.

            O sol já tingia tons de laranja, mostrando algumas ondas de sua luz no meio de toda aquela neblina e chuva calma e translúcida que pairava sobre as cabeças imaginativas das crianças, que brincavam e dançavam maravilhados com aquele lindo lugar. 

expressar-se

A dificuldade de expressar-se vem, para mim, ao encontro da possibilidade de uma retrospecção em relação ao que sinto e ao que venho a passar.

Sendo que o que sinto é derivado de uma intensa rede de conexões, permeável entre tantas formas de existência e como não dizer experiência, que na realidade acaba excedendo aquelas na medida em que apresenta-se de forma real e compacta e acaba também nos mostrando um tanto difusa no que se diz memória. Ora, se eu penso, e penso a partir de algo que me veio outrora, provocando-me uma experiência a partir de uma realidade que se apresenta sempre relativa.(digo relativa em mais de um sentido, que é a priori aparente e linear, que seria o de a relatividade da vivência ser individual, divergente então de um ser para outro, mas também é relativa a medida que uma mesma forma de existência da realidade pode acabar se mostrando ao menos diferente, pode uma mesma manifestação pode representar diferentes sensações, ao mesmo tempo em que então a nossa percepção relativa de realidade modifica-se ao longo das experiências acumuladas  por divergentes vivências, pois nosso ser é constantemente submetido a mudanças, algumas vezes discretas, outras  agressivas, que moldam aos poucos o que percebemos ao nosso redor.)

O que sentimos então seria uma mistura do que vivemos, com o que anteriormente vivenciamos, (de maneiras distintas) à medida que o que reconhecemos como realidade vai  sendo aos poucos definida. Obtemos então uma pré-realidade que comunica-se diretamente com a realidade que será construída por  uma percepção do real nascente agora. Ou seja, já temos uma pré-disposição à uma reação emocional e sendo assim consecutiva no sentido em que desencadeia uma ação que também já foi vivenciada. Essa nova percepção conserva-se então em nossa  noção do que é, e também do que foi, determinada reação, definindo agora uma nova pré-realidade, que posteriormente refletirá em uma próxima percepção do real que por ventura tome como referência a semelhança com esta pré-realidade estabelecida. (mas mesmo assim essa modifcação não é tampouco linear).

Diferentemente temos então sensações inusitadas e percepções primárias de sensações e emoções e pensamentos nunca antes sentidos, mas que mesmo assim comunicam-se com outras sensações vividas outrora, no sentido em que nossa resposta a qualquer coisa relaciona-se diretamente com o que tomamos como interpretação da realidade(como já dito individualizada quanto indivíduo e como singular quanto ao momento, que sempre é específico).

Aos poucos então o que sentimos de novo e o que já possui uma pré-interpretação um pouco mais concreta, representa o que temos como base para perceber o mundo e gravá-lo dentro de nós, enchendo-nos de imagens que permeiam entre nosso pensamento, nosso sonho, nossa percepção do mundo, nossos sentimentos, ações, emoções e tudo que diz respeito ao nosso ser assim como é, único.

Essas imagens que temos do mundo e de nós mesmos vão aos poucos desenvolvendo-se e acumulando outras, algumas vezes desconhecidas, outras já vivenciadas(mas nunca iguais, apenas semelhantes, a medida que o seu parecer imagético nunca é o mesmo) outras mesclam-se e moldam-se a partir de uma soma de mais de uma imagem que se comunicam, outras vezes ainda imagem que se criam  sei lá porque.

E, sendo assim, o homem precisou, por algum motivo, por mais mesquinho que possa ser, expressar essa noção de realidade e percepção, que também não se mostra como um fenômenos homogêneo e linear, uma vez que o que resulta de nossa expressão nunca é idêntico ao que se idealiza como imagem, muito menos no que se mostra percepção da realidade. Ao pensar em algo para desenhar idealizo uma sensação-imagem-ação que se define como meu objetivo. Ou seja, uma imagem torna-se molde de minha expressão, (seja ela imagem artística  quanto ao visual, quanto a transparência dos pensamentos por meio da escrita, ou também uma experiência auditiva, ou todas juntas, ou mais tantas outras) mas ela nunca é perfeitamente transcrita, e muito menos imutável, a medida em que sua primeira idealização do que se quer expressar não é, de maneira alguma, imutável.  Concomitantemente, a expressão é derivada de uma intenção, seja ela qual for, e essa intenção modifica uma mesma imagem. Todos sabemos o que é um cavalo, e posso pensar em expressá-lo. Ao pensar em Expressá-lo posso usar da mimética e imitá-lo, posso desenhá-lo e assim idealizo uma forma do que tomo como um cavalo, que nunca é previamente definida, quando penso em cavalo hoje, pode ser um cavalo divergente do cavalo imaginado amanhã. Sendo assim, só de pensar em uma possibilidade de expressão  já me deparo com uma peculiaridade absurda, no sentido de que o que desejo expressar é único para mim e único também por ser meu e não de outra pessoa, o que representa uma tremenda carga de definição do que é a imagem ou o pensamento que quero expressar. Também me deparo com o fato de que ao transcrever ou desenhar ou pintar ou imitar o que desejo, minha primeira intenção de fazê-lo não é, absolutamente idêntica a minha primeira idealização do que expresso, e vai ficando cada vez menos linear a medida em que me expresso, difundindo-se totalmente da minha primeira idealização.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Algumas vezes meus sentidos, sentinelas afoitas,
Jogam-se no nada, adormecem,
E sinto despregar o que é matéria, corpo tenso, dolorido.
Pensamentos antagônicos, arte de refletir-se,
Sacudo-me, esvaio, transcrevo-me em diagnósticos inaplicáveis,
Algumas vezes sou corpo, noutras durmo.
Tenro e cru, despeço-me, devoro meus vários lados,
Sou putrefação, em algum sentido oposto a tudo isso já dito.
Vou remexendo dolorosas feridas refeitas,
Rostos que não via há tempos, por espelhos entre-partidos, entreabertos, entretecidos, entristecidos, estremecidos.
Entro em um universo múltiplo. Dou de cara comigo.
Brigo, esperneio, volto ao mesmo ponto, no início do túnel, levemente dourado,
Risada irônica, ecoo dentro de mim,
Salto por egoísmos caricatos, figuras charlatânicas, fome de fogo.
Volto a vibrar com luz.
Salto, desapareço dentro de mim, retomo os sentidos.
Olho cortinas pouco vermelhas, de sangue amarelado pelo sol,
Escuto batidas de coração aflito, e rostos a me olharem.
Enfim sós, enfim muitos, enfim troncos vibrantes, em fim.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Tem vezes em que a gente entra muito fundo nas coisas. As vezes eu entro na profundeza de uma madrugada, um pouco fria, com um tanto de orvalho espalhado entre fractais lunares. Espalho-me um pouco pela imensidão de momentos um pouco frios, mas intensos, como que um dia que acaba com chuva.
            Algumas horas sinto meu corpo inteiro um pouco dolorido, um pouco cheio, cansado do mundo inteiro nas costas, pesando a postura que deveria ir leve buscar o ar e o pensamento. Caio os ombros, tento achar conforto. Nem sempre existe conforto, e penso que não é o que quero agora. Como chuva em final de dia, quero me ater ao desconforto, quero embrenhar-me no que não conheço ainda, um pouco para saber como é estar completo. O que  não pressupõe que o completo esteja nos outros, está nos outros, mas dentro de nós nos outros. A ligação que sinto tênue deveria ser um estado de não corpo entre outro. Completo, completo enquanto não cartesiano. Não são fragmentos que se unem em ordenação lógica, são todos que se ligam em pequenos fragmentos.  As vezes entendo o todo, as vezes não, mas nunca consegui entender o que são os fragmentos. Então me solto muito as vezes, com os cabelos deitando renitentes no meu rosto, tocando de leve Constancia. Um balanço, e aos poucos sou todo o movimento, aos poucos sou todo o vento, e me deixo levar. Torno-me  um pouco de tudo, solto e dispersos em ondas que toco e não controlo, que esbarro mas não entro, e quando entro vou tão fundo que quero sair. Acho que sinto pouco tempo. Acho que talvez o tempo é que tenha se desfeito.